Uma Vida Cheia do Espírito

03/09/2011 12:48

 

UMA VIDA CHEIA DO ESPÍRITO

Por

CHARLES G. FINNEY

Índice

 

 

CAPÍTULO 1: Poder do Alto 

CAPÍTULO 2: 0 que Vem a Ser?

CAPÍTULO 3: 0 Revestimento do Espírito

CAPÍTULO 4: Revestimento do Poder do Alto

CAPÍTULO 5: Será "Duro Este Discurso?"

CAPÍTULO 6: Oração Vitoriosa

CAPÍTULO 7: Como Ganhar Almas

CAPÍTULO 8: Como Vencer o Pecado

CAPÍTULO 9: Pregador, Salva a Ti Mesmo

 

Capítulo 1

 

Poder do Alto

 

 Peço vênia para, através desta coluna, corrigir a impressão errônea recebida por alguns dos participantes do recente Concílio em Oberlin, do breve comentário que lhes fiz na manhã do sábado e, depois, no domingo. Na primeira dessas ocasiões, chamei a atenção dos presentes para a missão da Igreja, de fazer discípulos de todas as nações, de acordo com o registro de Mateus e de Lucas. Afirmei que essa incumbência foi dada por Cristo a toda a Igreja, da qual cada membro está na obrigação de fazer da conversão do mundo o trabalho a que dedique a sua vida. Levantei então duas questões: 1) de que necessitamos, para conseguir sucesso nessa obra imensa? 2) Como podemos obtê-lo?

Resposta -- 1. Precisamos ser revestidos de poder do alto. Cristo anteriormente informara aos discípulos que, sem ele, nada podiam fazer. Quando os encarregou da conversão do mundo, acrescentou: "Permanecei, porém, na cidade (Jerusalém), até que do alto sejais revestidos de poder. Sereis batizados com o Espírito Santo não muito depois destes dias. Eis que sobre vós envio a promessa de meu Pai". Esse batismo do Espírito Santo, a promessa do Pai, esse revestimento do poder do alto, Cristo informou-nos expressamente ser a condição indispensável para a realização da obra de que ele nos incumbiu.

2. Como havemos de obtê-lo? Cristo prometeu-o expressamente, a toda a Igreja e a cada pessoa cujo dever é trabalhar para conversão do mundo. Ele admoestou os primeiros discípulos a que não pusessem mãos à obra enquanto não recebessem esse revestimento de poder do alto. Tanto a promessa como a admoestação têm igual aplicação a todos os cristãos de todos os tempos e povos. Ninguém, em tempo algum, tem o direito de esperar bom êxito, se não obtiver primeiro o poder do alto. O exemplo dos primeiros discípulos ensina-nos como obter esse revestimento. Primeiramente consagraram-se a esse trabalho, continuando em oração e súplicas até que, no dia de Pentecoste, o Espírito Santo veio sobre eles e receberam o prometido revestimento do poder do alto. Eis, portanto, a maneira de obtê-lo.

O Concílio pediu-me que dissesse mais sobre o assunto, razão pela qual, no domingo, tomei por texto a declaração de Cristo, de que o Pai está mais pronto a dar o Espírito Santo àqueles que lho pedirem, do que nós a darmos boas dádivas a nossos filhos. Disse a eles:

1. Este texto informa-nos que é sumamente fácil obter-se o Espírito Santo, ou seja, esse revestimento de poder da parte do Pai.

2. Isso se torna assunto constante de oração: todos o pedem, em todas as ocasiões; entretanto, à vista de tanta intercessão, é relativamente pequeno o número daqueles que, efetivamente, são revestidos desse Espírito do poder do alto! A lacuna não é preenchida: a falta de poder é assunto de constante reclamação. Cristo diz: "Todo o que pede recebe", porém não há negar que existe um "grande abismo" entre o pedir e o receber, o que representa pedra de tropeço para muitos. Como, então, se explica essa discrepância?

Tratei de mostrar por que muitas vezes não se recebe o revestimento. Eu disse a eles: 1) De modo geral, não estamos dispostos a ter aquilo que desejamos e pedimos: 2) Deus nos informa expressamente que, se contemplarmos a iniqüidade no coração, ele não nos ouvirá. Muitas vezes, porém, quem pede é complacente consigo mesmo; isso é iniqüidade, e Deus não o ouve; 3) é descaridoso; 4) é severo em seus julgamentos; 5) é auto-dependente; 6) repele a convicção de pecado; 7) recusa-se a fazer confissão a todas partes envolvidas; 8) recusa-se a fazer restituição às partes prejudicadas; 9) é cheio de preconceitos insinceros; 10) é ressentido; 11) tem espírito de vingança; 12) tem ambição mundana; 13) comprometeu-se em algum ponto e não quer dar o braço a torcer, ignora e rejeita maiores esclarecimentos; 14) defende indevidamente os interesses de sua denominação; 15) defende indevidamente os interesses da sua própria congregação; 16) resiste aos ensinos do Espírito Santo; 17) entristece o Espírito Santo com dissenção; 18) extingue o Espírito pela persistência em justificar o mal; 19) entristece-o pela falta de vigilância; 20) resiste-lhe dando largas ao mau gênio; 21) é incorreto nos negócios; 22) é impaciente para esperar no Senhor; 23) é egoísta de muitas formas; 24) é negligente na vida material, no estudo, na oração; 25) envolve-se demasiadamente com a vida material, e os estudos, faltando-lhe por isso tempo para oração; 26) não se consagra integralmente, e --27) o último e maior motivo, é a incredulidade: pede o revestimento, sem real esperança de recebê-lo. "Quem em Deus não crê, mentiroso o faz." Esse, então, é o maior pecado de todos. Que insulto, que blasfêmia, acusar a Deus de mentir!

Fui obrigado a concluir que, nesses e noutros pecados é que se encontra a razão de se receber tão pouco quando tanto se pede. Falei que não havia tempo para apresentar o outro lado da questão. Alguns dos irmãos perguntaram depois: "Qual é o outro lado?" O outro lado apresenta a certeza de que receberemos o prometido revestimento de poder do alto e seremos bem-sucedidos em ganhar almas, desde que peçamos e cumpramos as condições, claramente reveladas. da oração vitoriosa. Observe-se que o que eu disse no domingo versava sobre o mesmo assunto do dia anterior e era um aditamento a ele.

O mal-entendido a que fiz alusão foi o seguinte: se primeiro nos desfizermos de todos esses pecados que nos impedem de receber o revestimento, não estaremos já de posse da bênção? De que mais precisamos?

Resposta: há grande diferença entre a paz e o poder do Espírito Santo na alma. Os Discípulos eram cristãos antes do dia de Pentecoste e, como tais, possuíam certa medida do Espírito Santo. Forçosamente, tinham a paz resultante do perdão dos pecados e do estado de justificação, porém ainda não tinham o revestimento de poder necessário para desempenharem a obra que lhes fora atribuída. Tinham a paz que Cristo lhes dera, mas não o poder que lhes prometera. Isso pode se dar com todos os cristãos, e, a meu ver, está exatamente aí o grande erro da Igreja e do ministério: descansam na conversão e não buscam até obter esse revestimento de poder do alto.

Resulta que tantos que professam a fé não têm poder nem com Deus nem com o homem. Não são vitoriosos, nem com um nem com o outro. Agarram-se a uma esperança em Cristo, chegando mesmo a ingressar no ministério, mas deixam de parte a admoestação a que esperem até que sejam revestidos do poder do alto. Mas, traga alguém todos os dízimos e todas as ofertas ao tesouro de Deus; deponha tudo sobre o altar, nisso prove a Deus, e verificará que Deus "abrirá as janelas do céu e derramará uma bênção tal que dela lhe advenha a maior abastança".

 

Capítulo 2

 

O que Vem a Ser?

 

Os apóstolos e irmãos, no dia de pentecoste, receberam-no. Mas o que receberam? Que poder exerceram depois daquele acontecimento?

Receberam poderoso batismo do Espírito Santo, vasto incremento da iluminação divina. Esse batismo proporcionou grande diversidade de dons que foram usados para a realização da obra. Abrangia evidentemente os seguintes aspectos: o poder de uma vida santa; o poder de uma vida de abnegação (essas manifestações hão de ter tido grande influência sobre aqueles a quem proclamavam o evangelho); o poder da vida de quem leva a cruz; o poder de grande mansidão, que esse batismo os capacitou a evidenciar por toda parte; o poder do amor na proclamação do evangelho; o poder de ensinar: o poder de uma fé viva e cheia de amor; o dom de línguas; maior poder para operar milagres; o dom da inspiração, ou seja, a revelação de muitas verdades que antes não reconheciam; o poder da coragem moral para proclamar o evangelho e cumprir as recomendações de Cristo, custasse o que custasse.

Nas circunstâncias em que os discípulos se achavam, todos esses poderes eram indispensáveis para seu sucesso. Contudo, nem separadamente nem todos em conjunto constituíam aquele poder do alto que Cristo prometera, e que eles evidentemente receberam. O que manifestamente lhes sobreveio, como meio supremo e de suprema importância para o sucesso, foi o poder para vencer e convencer, junto de Deus e dos homens: o poder de fixar impressões salvadoras na mente dos homens.

Esse último é que foi sem dúvida o que eles entenderam que Cristo Ihes prometera. Ele encarregara a Igreja da missão de converter o mundo à sua Pessoa. Tudo que acima citei foram apenas os meios que jamais poderiam colimar o fim em vista, a não ser que fossem vivificados e se tornassem eficientes pelo poder de Deus. Os apóstolos, sem dúvida, entendiam isso, e, depondo a si mesmos e a tudo que possuíam sobre o altar, puseram cerco ao trono da graça no espírito de inteira consagração à obra.

Receberam, de fato, os dons acima citados; mas, principalmente, esse poder de impressionar os homens para a salvação. Ele manifestou-se logo em seguida: começaram a dirigir-se à multidão e --maravilha das maravilhas! -- três mil converteram-se na mesma hora. Note-se, porém, que não foi manifestado por eles nenhum novo poder nessa ocasião, exceto o dom de línguas. Não operaram dessa feita nenhum milagre, e mesmo as línguas, usaram-nas simplesmente como meio de se fazerem entender.

Note-se que ainda não tinham tido tempo para revelar dons do Espírito, além dos que mencionamos acima. Não tiveram naquela hora a oportunidade de mostrar uma vida santa, nem algumas das poderosas graças e dons do Espírito. O que foi dito na ocasião, conforme o registro bíblico, não podia ter causado a impressão que causou, se não fosse dito por eles com novo poder, a fim de produzir no povo uma impressão salvadora. Não se tratava do poder da inspiração, pois estavam apenas declarando certos fatos que eram de seu conhecimento. Não foi o poder da erudição e cultura humana, pois disso tinham muito pouco. Não foi o poder da eloqüência humana, pois disso também não parece ter havido muito.

Foi Deus falando neles e por meio deles. Foi o poder vindo do alto, sim, Deus neles, causando uma impressão salvadora naqueles a quem se dirigiam. Esse poder de impressionar os homens para a salvação permanecia com eles e sobre eles. Foi essa, sem dúvida, a promessa principal feita por Cristo e recebida pelos apóstolos e cristãos primitivos. Em maior ou menor medida, permanece na Igreja desde então. Trata-se de um fenômeno misterioso que muitas vezes se manifesta de modo surpreendente. Às vezes uma simples frase, uma palavra, um gesto, ou mesmo um olhar, transmite esse poder de maneira vitoriosa.

Para honra exclusiva de Deus, contarei um pouco da minha própria experiência no assunto. Fui poderosamente convertido na manhã do dia 10 de outubro. À noitinha do mesmo dia, e na manhã do dia seguinte, recebi batismos irresistíveis do Espírito Santo, que me traspassaram, segundo me pareceu, corpo e alma. Imediatamente me achei revestido de tal poder do alto, que umas poucas palavras ditas aqui e ali a indivíduos provocavam a sua conversão imediata.

Parecia que minhas palavras se fixavam como flechas farpadas na alma dos homens. Cortavam como espada; partiam como martelo os corações. Multidões podem confirmar isso. Muitas vezes uma palavra proferida, sem que disso eu me lembrasse, trazia convicção, resultando, em muitos casos, na conversão quase imediata. Algumas vezes me achava vazio desse poder: saía a fazer visitas e verificava que não causava nenhuma impressão salvadora. Exortava e orava, com o mesmo resultado. Separava então um dia para jejum e oração, temendo que o poder me houvesse deixado e indagando ansiosamente pela razão desse estado de vazio. Após ter-me humilhado e clamado por auxílio, o poder voltava sobre mim em todo o seu vigor. Tem sido essa a experiência da minha vida.

Poderia encher um volume com a história da minha própria experiência e observação com respeito a esse poder do alto. É um fato que se pode perceber e observar, mas é um grande mistério. Tenho dito que, às vezes, um olhar encerra em si o poder de Deus. Muitas vezes o tenho presenciado. O seguinte fato serve de ilustração.

Pregava pela primeira vez em uma vila manufatureira. Na manhã seguinte entrei em uma das fábricas para vê-la funcionar. Ao entrar no departamento de tecelagem, vi um grande número de moças e notei que algumas me olhavam, depois umas às outras, de um modo que indicava espírito frívolo e que me conheciam. Eu, porém, não conhecia nenhuma delas. Ao aproximar-me mais das que me tinham reconhecido, parecia que aumentavam suas manifestações de mente leviana. Sua leviandade impressionou-me; senti-a no íntimo. Parei e olhei-as, não sei de que maneira, pois minha mente estava absorta com o senso da sua culpa e do perigo que representavam.

Ao firmar o olhar nas jovens, observei que uma delas se tornou muita agitada. Um fio partiu-se; ela tentou emendá-lo, porém suas mãos tremiam de tal forma que não pôde fazê-lo. Vi imediatamente que aquela sensação se espalhava, tornando-se geral entre aquele grupo. Olhei-as firmemente, até que uma após outras, entregavam-se e não davam mais atenção aos teares. Caíram de joelhos, e a influência se espalhou por todo o departamento. Eu não tinha proferido uma palavra sequer e, mesmo que o tivesse, o ruído dos teares não teria deixado que a ouvíssemos. Dentro de poucos minutos o trabalho ficou abandonado. Lágrimas e lamentações por todos os lados. Nesse instante entrou o dono da fábrica, que era incrédulo, acompanhado, creio, pelo superintendente, que professava a fé. Quando o dono viu o estado de cousas, disse ao superintendente: "Mande parar a fábrica".

"É mais importante", acrescentou rapidamente, "a salvação dessas almas do que o funcionamento da fábrica". Assim que cessou o troar das máquinas, o dono perguntou; "Como faremos? Precisamos de um lugar de reunião, onde possamos receber instrução". O superintendente respondeu: "O salão de fiação serve". Os fusos foram levantados para desocupar o lugar e toda a fábrica avisada para se reunir naquele salão. Tivemos uma reunião maravilhosa. Orei com eles e dei as instruções que na ocasião eram cabíveis. A palavra foi com poder. Muitos manifestaram esperança naquele mesmo dia, e dentro de poucos dias. segundo fui informado, quase todos os trabalhadores daquele grande estabelecimento, inclusive o dono, criam em Cristo.

Esse poder é uma grande maravilha! Muitas vezes já vi pessoas incapazes de suportar a palavra. As declarações mais simples e comuns cortavam os homens como espada, onde se achavam sentados, tirando-lhes a força física e tornando-os desamparados como mortos. Várias vezes já fiquei impossibilitado de levantar a voz, ou de falar em oração ou exortar a não ser de modo bem suave, sem dominar inteiramente os presentes. Não que eu pregasse de modo a aterrorizar o povo: os mais doces sons do evangelho os submergiam. Parece que às vezes esse poder permeia o ambiente das pessoas que o possuem. Muitas vezes em uma comunidade grande número de pessoas é revestido desse poder, e então toda a atmosfera do lugar parece ficar impregnada com a vida de Deus. Os estranhos que ali chegam de fora, de passagem pelo lugar, são, de repente, tomados de convicção de pecado e, em muitos casos, se convertem a Cristo.

Quando os cristãos se humilham e consagram novamente a Cristo tudo o que possuem, pedindo então esse poder, recebem muitas vezes esse batismo e se tornam instrumentos da conversão de mais almas em um dia do que em toda a sua vida até então. Enquanto os crentes permanecem humildes bastante para continuar de posse desse poder, a obra da conversão prossegue até que comunidades e mesmo regiões inteiras se convertem a Cristo. O mesmo acontece com pastores. Mas este artigo já está bastante longo. Se me permitirem. terei mais que dizer sobre o assunto.

 

Capítulo 3

 

O Revestimento do Espírito

 

Depois da publicação pelo Independente do meu artigo "O Poder do Alto", fiquei detido por prolongada enfermidade. Nesse interim recebi inúmeras cartas indagando sobre o assunto. Focalizam de modo geral três questões em particular:

1) Pedem novas ilustrações da manifestação desse poder.

2) Indagam: "Quem tem o direito de esperar semelhante revestimento?"

3) De que modo ou em que condições pode ser alcançado?

Não me sendo possível responder pessoalmente às cartas, pretendo, com o vosso consentimento, e se a minha saúde continuar a melhorar, atendê-las através de breves artigos nesta coluna. Desta feita relatarei outra manifestação do poder do alto, conforme eu mesmo presenciei. Pouco tempo depois de ter sido licenciado para pregar, fui a uma reunião do país onde eu era completamente estranho. Fui a pedido de uma sociedade missionária feminina, localizada no condado de Oneida, Estado de Nova Iorque. Foi, se não me engano, em princípios de maio que visitei a vila de Antuérpia, na parte norte do condado de Jefferson. Fiquei no hotel da vila, e ali soube que, na ocasião, não se realizavam reuniões religiosas no lugar.

Havia um salão de cultos, mas estava fechado. Mediante esforços pessoais, consegui reunir uma poucas pessoas na sala da residência de uma senhora crente e preguei-lhes a palavra na noite após a minha chegada. Ao andar pela vila, fiquei horrorizado com a linguagem blasfema que ouvia entre os homens por toda parte. Consegui licença para pregar no prédio da escola no domingo seguinte, porém antes que chegasse o domingo sentia-me desanimado, e quase aterrorizado, em virtude do estado em que se encontrava aquela comunidade. No sábado, o Senhor trouxe ao meu coração as seguintes palavras, dirigidas a Paulo pelo Senhor Jesus (At 18.9-10): "Não temas, mas fala e não te cales: porque eu sou contigo, e ninguém lançará mão de ti para te fazer mal, pois tenho muito povo nesta cidade". Isso acalmou por completo os meus temores; mas o meu coração estava cheio de ansiedade pelo povo.

Na manhã de domingo levantei-me cedo e me refugiei num bosque fora da vila, a fim de derramar o coração diante de Deus suplicando-lhe uma bênção sobre os trabalhos do dia. Não pude exprimir em palavras a angústia da minha alma, mas lutei com gemidos e, creio, muitas lágrimas, durante uma ou duas horas, sem encontrar alívio. Voltei para o meu quarto no hotel, mas quase em seguida fui de novo para o bosque. Fiz isso por três vezes. Da última vez obtive completo alívio, já na hora da reunião.

Fui para a escola e encontrei-a completamente lotada. Tirei minha pequena Bíblia do bolso e li este texto: "Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna". Expus a bondade de Deus em contraste com a maneira pela qual ele é tratado por aqueles que amou e aos quais deu o seu Filho. Argüi os meus ouvintes pelas suas blasfêmias, e, reconhecendo entre eles vários cujas pragas eu ouvira pessoalmente, com o coração cheio de ardor e com lágrimas nos olhos apontei-os, dizendo: "Ouvi esses homens rogarem de Deus pragas sobre seus companheiros." A Palavra teve efeito poderoso. Ninguém pareceu ofender-se, porém quase todos ficaram grandemente esternecidos. Terminado o culto, o bondoso dono, o Sr. Copeland, levantou-se e disse que à tarde abriria a casa de oração. Assim fez, e a casa esteve repleta, e, como pela manhã, a Palavra operou com muito poder.

Assim começou poderoso avivamento na vila, o qual, pouco depois, espalhou-se em todas as direções. Creio que foi no segundo domingo depois desse, que, ao descer do púlpito à tarde, um senhor de idade me procurou e disse: "O senhor não poderia pregar em nossa localidade? Nunca tivemos ali reuniões religiosas". Informei-me da direção e da distância, e combinei de pregar lá na tarde seguinte, segunda-feira, ás cinco horas, na escola.

No domingo eu pregara três vezes na vila e assistira duas reuniões de oração; na segunda-feira fui a pé cumprir esse compromisso. Fazia bastante calor, e antes de chegar, comecei a sentir-me fraco para andar e com grande desalento de espírito. Sentei-me debaixo de uma sombra, à beira do caminho, sentindo-me fraco para chegar ao destino e, mesmo que chegasse, desanimado para abrir a boca diante do povo.

Quando enfim cheguei, encontrei a casa repleta. Comecei em seguida o culto, anunciando um hino. Tentaram cantar, porém a terrível desarmonia causou-me verdadeira angústia. Inclinei-me para frente, com os cotovelos apoiados nos joelhos e as mãos sobre os ouvidos, e ainda sacudia a cabeça, procurando excluir a dissonância que, mesmo assim, a custo suportei. Quando pararam de cantar, lancei-me de joelhos, em estado de quase desespero.

Até esse momento não tinha nenhuma idéia de que texto usaria na pregação. Ao levantar-me da oração, o Senhor me deu este: "Levantai-vos, e saí deste lugar. porque o Senhor há de destruir a cidade". Falei ao povo, o mais aproximadamente que pude recordar, onde se encontrava o texto na Bíblia, e prossegui contando-lhes da destruição de Sodoma. Esbocei a história de Abraão e Ló; de seus tratos um com o outro; de como Abraão orou por Sodoma; de Ló, o único homem piedoso achado na cidade. Enquanto isso, notei que a fisionomia dos presentes demonstrava que estavam muito zangados comigo; assumiam mesmo aspecto ameaçador, e alguns dos homens perto de mim pareciam que iam me bater. Eu não entendia isso, pois estava apenas dando, e isso com grande liberdade de espírito, alguns esboços interessantes da história bíblica.

Assim que terminei o esboço histórico, voltei-me ao povo e disse-lhes que eu entendia que nunca tinham tido reuniões religiosas naquela vizinhança. Aplicando esse fato, golpeei-os com toda a força com a espada do Espírito. A partir desse momento a seriedade do ambiente foi aumentando rapidamente. Daí a pouco pareceu cair sobre a congregação um choque instantâneo. Não posso descrever a sensação que tive, nem a que se manifestava na congregação, mas parecia que palavra, literalmente, cortava como espada. O poder do alto veio sobre eles numa torrente tal, que caíam dos bancos em todas as direções.

Dentro de um minuto em quase toda a congregação estavam, ou de joelhos, prostrados no chão, ou em alguma posição de humildade diante de Deus. Cada qual clamava ou gemia rogando a misericórdia divina para sua alma. Não davam mais atenção a mim ou à minha pregação. Procurei ganhar a sua atenção, mas não consegui. Observei o senhor de idade que me tinha convidado, sentado ainda, perto do meio do auditório. Olhava em redor, atônito, com os olhos quase saltando das órbitas. Apontando para ele, gritei com toda a força: "O senhor não pode orar?" Ele ajoelhou-se e berrou uma breve oração, o mais alto que pôde: mas ninguém lhe deu atenção.

Depois de ter olhado em volta de mim alguns momentos, ajoelhei-me, coloquei a mão sobre a cabeça de um jovem que estava ajoelhado aos meus pés e comecei a orar pela sua alma. Obtive sua atenção e, falando-lhe ao ouvido, preguei-lhe Jesus. Dentro de poucos momentos ele se entregou a Jesus pela fé, e então irrompeu em oração a favor dos que estavam ao seu redor. Voltei-me então a outro, do mesmo modo, e com o mesmo resultado; depois outro, e outro, até que não sei quantos se tinham entregado a Cristo e oravam fervorosamente pelos demais.

Depois de ter continuado assim até o cair da tarde, fui obrigado a entregar a reunião ao senhor de idade que me convidara, para atender um compromisso que tinha assumido em outro local. À tarde do dia seguinte fui chamado para voltar, pois não tinham conseguido dispersar a reunião. Tiveram que deixar a casa da escola para dar lugar às aulas, mas transferiram-se para uma residência próxima, onde encontrei uma porção de pessoas que ainda estavam demasiadamente ansiosas e oprimidas pela convicção de pecados. Por isso não podiam voltar para casa. Foram logo acalmadas pela Palavra de Deus, e creio que todas obtiveram a esperança em Cristo antes de ir para casa.

Nota: eu era totalmente estranho naquele lugar. Nunca o tinha visto nem dele ouvira falar, conforme relatei. Mas agora, na segunda visita, fiquei sabendo que o lugar era chamado de Sodoma, por causa da sua impiedade, e que o senhor de idade que me convidara era chamado de Ló pelo fato de ser a única pessoa do lugar que professava religião.

Dessa maneira o avivamento irrompeu nessa região. Faz muitos anos que não volto lá; mas em 1856, me parece, quando fazia um trabalho em Siracusa, Nova Iorque, fui apresentado a um ministro de Cristo do condado de São Lourenço, de nome Cross. Ele me disse: "Sr. Finney, o senhor não me conhece; mas lembra-se de ter pregado num lugar chamado Sodoma?" "Jamais me esquecerei", respondi. "Pois eu era jovem nessa ocasião", disse ele, "e me converti naquela reunião." Ele ainda vive; é pastor de uma das igrejas daquele condado, e é pai do superintendente do nosso departamento preparatório. Os que moram na região testificam dos resultados permanentes daquele abençoado avivamento. O que pude descrever em palavras dá apenas uma pálida idéia daquela extraordinária manifestação do poder do alto que acompanhou a pregação da Palavra.

 

 

Capítulo 4

 

Revestimento do Poder do Alto

 

Neste artigo pretendo estudar as condições sob as quais podemos obter o revestimento de poder. Tomemos informações nas Escrituras. Não pretendo encher este jornal de citações da Bíblia, mas simplesmente registrar alguns fatos que serão logo reconhecidos por todos os leitores das Escrituras. Se os leitores do presente artigo quiserem conhecer, no último capítulo de Mateus e de Lucas, a incumbência que Cristo deu aos discípulos, e, ainda, os dois primeiros capítulos de Atos dos Apóstolos, estarão prontos para apreciar o que vou dizer neste artigo.

1) Os discípulos já estavam convertidos a Cristo, e tiveram confirmada a sua fé pela ressurreição de Jesus. Nesta altura, porém, devo esclarecer que a conversão a Cristo não deve ser confundida com a consagração à grande obra da conversão do mundo. Na conversão, a pessoa trata direta e pessoalmente com Cristo. Abre mão dos seus preconceitos, antagonismos, justiça própria, incredulidade e egoísmo. Aceita Cristo, confia nele e a ele ama acima de tudo. Tudo isso os discípulos tinham feito, uns mais claramente. outros, menos. Ainda não tinham recebido, porém, nenhuma incumbência precisa, nem tampouco qualquer revestimento especial de poder para desempenharem uma incumbência.

2) Depois, porém, que Cristo dissipou o desnorteamento que lhes resultara da crucificação de Jesus e confirmou sua fé por meio de repetidos encontros com eles. deu-lhes a grande incumbência de ganhar para ele todas as nações. Admoestou-os, porém, a que aguardassem em Jerusalém até que fossem revestidos de poder do alto, o que, disse ele, haviam de receber dentro de poucos dias. Observemos agora o que fizeram. Reuniram-se, homens e mulheres, para orar. Aceitaram a incumbência, chegando, sem dúvida, à compreensão da natureza do encargo e da necessidade do revestimento espiritual que Cristo lhes prometera. Ao continuarem, dia após dia, em oração e conferência, chegaram, sem dúvida, a apreciar cada vez mais as dificuldades que os haviam de cercar, e a sentir cada vez mais a sua própria insuficiência para a tarefa.

Se examinarmos as circunstancias e os seus resultados. chegaremos à conclusão de que eles, sem exceção, se consagraram e tudo quanto tinham para a conversão do mundo, como sendo esta a tarefa da vida. Abandonaram totalmente a idéia de viverem para si mesmos, e se dedicaram com todas as forças à obra que lhes fora confiada. Essa consagração de si mesmos à obra, essa auto-renúncia, esse morrer para tudo quanto o mundo lhes pudesse oferecer, forçosamente precedeu a busca inteligente do prometido revestimento de poder do alto. Continuaram então, de comum acordo, em oração pelo prometido batismo do Espírito, que abrangia tudo quanto era essencial ao bom êxito.

Nota. Eles tinham diante de si uma obra a realizar. Tinham uma promessa de poder para que a pudessem desempenhar. Foram admoestados a esperar até que a promessa se cumprisse. Como esperaram? Não na indiferença e inatividade; não em preparativos, por meio de estudos e outros recursos, visando dispensar o poder prometido; não entregando-se aos afazeres normais e fazendo de vez em quando uma oração pedindo que cumprisse a promessa; ao contrário, permaneceram em oração e persistiram no pedido até que veio a resposta. Compreendiam que seria um batismo do Espírito Santo. Sabiam que viria da parte de Cristo. Oraram com fé. Aguardaram na mais firme expectativa, até o revestimento. Deixemos, pois, que esses fatos nos instruam quanto às condições para se receber o revestimento de poder.

Nós, como cristãos, temos a mesma incumbência. Tanto quanto aqueles discípulos, necessitamos do revestimento de poder do alto. Evidentemente a mesma ordem nos é dada, de esperarmos em Deus até que o recebamos. Temos a mesma promessa que eles tinham: tomemos, pois, essencialmente e em espírito, o mesmo caminho que tomaram. Eles eram crentes e tinham certa medida do Espírito para guiá-los na oração e na consagração. Nós também o temos.

Todo crente possui uma certa medida do Espírito de Cristo, o suficiente do Santo Espírito para nos levar à verdadeira consagração e nos inspirar com a fé que é essencial para a vitória na oração. Deixemos, pois, de entristecê-lo ou resistir-lhe: aceitemos a incumbência, consagrando-nos integralmente, com tudo quanto possuímos, à salvação de almas, como o nosso grande e único trabalho na vida. Coloquemo-nos sobre o altar, como tudo que temos e somos, ali permanecendo e persistindo na oração até que recebamos o revestimento.

Quero reafirmar que a conversão a Cristo não deve ser confundida com a aceitação dessa incumbência de salvar o mundo. Aquela é uma transação pessoal entre a alma e Cristo, tratando da própria salvação; esta é a aceitação do serviço em que Cristo se propõe a ocupar-nos. E Cristo não nos exige a confecção de tijolos sem nos fornecer a palha necessária. Àquele a quem ele dá a incumbência, dá também a admoestação e a promessa. Se de coração aceitarmos o serviço, crermos na promessa e atendermos à admoestação a que esperemos no Senhor até que a nossa força seja renovada, havemos de receber o revestimento.

É da mais absoluta importância que compreendamos que cada crente individualmente recebe de Cristo o encargo de conquistar o mundo. Todos nós temos sobre os ombros a grande responsabilidade de ganhar para Cristo o maior número possível de almas. É esse o grande privilégio e dever de todos os discípulos de Cristo. Há vários setores nesse trabalho, mas para todos eles podemos e devemos possuir poder, para que, quer preguemos ou oremos, escrevamos ou publiquemos, negociemos, viajemos, cuidemos de crianças ou administremos o governo do Estado, seja qual for a nossa ocupação, toda a nossa vida e influência sejam repletas desse poder. Cristo declara: "Quem crer em mim, como diz a Escritura, do seu interior fluirão rios de água viva"; quer dizer, que dele procederá uma influência cristã, tendo em si o fator do poder para levar a impressão da verdade de Cristo ao coração dos homens.

A grande carência da Igreja atualmente é, primeiro, a convicção profunda de que essa incumbência de ganhar o mundo é dada a cada um dos discípulos de Cristo como a tarefa a realizar na vida. É lamentável termos de dizer que a grande massa dos cristãos professos, segundo parece, nunca se impressionou com essa verdade. O trabalho de salvar almas deixam-no por conta dos ministros.

A segunda grande carência é a convicção profunda da necessidade desse revestimento de poder sobre cada um individualmente. Muitos que professam a fé imaginam que isso é apenas para aqueles que são chamados para a carreira ministerial. Deixam de compreender que todos são chamados a pregar o evangelho; que a vida inteira de cada cristão deve ser uma proclamação das boas-novas.

Falta, em terceiro lugar. uma fé


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